Para as cobras, o perigo é o homem

Um botânico americano passou sete anos no Brasil. Acampando durante longos períodos na floresta amazônica, para estudar as espécies vegetais. Achava que a abundância de cobras na mata densa era um mito. Porque nunca havia topado com serpentes. Venenosas ou não. A convicção durou até o dia em que ele foi à mata acompanhando uma especialista em cobras e percebeu por quantas centenas de serpentes havia passado naqueles anos todos, sem saber.

A história do botânico, que desde aquele dia não foi mais à mata desprevenido, se repete com milhões de brasileiros que vivem da lavoura ou tem atividades de lazer associadas ás matas e aos campos. Bem poucos são os que vêem as cobras ou percebem sua presença. A camuflagem é a especialidade desses répteis, capazes de detectar a presença de seres humanos e fugir muito antes de serem percebidos. As cobras têm uma "audição" acurada típica de um animal que vive com o corpo todo encostado no chão e pode ser facilmente pisoteado.

COM MEIO BOTE ARMADO:

Sem tímpanos, que seriam pouco eficazes na altura do chão, com tantos obstáculos para atrapalhar a propagarão dos sons, elas tem um ossinho entre o maxilar c o ouvido interno que transmite as vibrações do solo e os sons de baixa freqüência para o cérebro.

Alertadas por essa "audição", mesmo quando estão dormindo, as serpentes sempre percebem o homem antes que este as note. E aguardam sua aproximação, com meio bote armado. Não por ruindade, mas contra a ameaça de pisoteio.

A curta distancia, as cobras passam a vigiar o homem com outros sentidos. Sua visão não é muito nítida: elas não distinguem bem objetos parados, mas acompanham com segurança qualquer movimento. A falta de nitidez da visão é compensada com o olfato e, em alguns casos, com o radar térmico.

O olfato das serpentes é diferente do faro dos mamíferos. Elas não sentem cheiro com o nariz, mas com as duas pontas da língua. Ao colocar a língua para fora, elas captam o cheiro no ar e levam a mensagem até o cérebro através de dois buraquinhos no céu da boca, onde enfiam as pontas. Assim, sabem que tipo de animal esta por perto, mesmo quando o animal está atrás delas ou escondido na vegetação.

COM MEDO DO HOMEM:

Com todos esses recursos, as cobras venenosas muito se assemelham a máquinas de guerra, sempre prontas para desferir botes. Só que são máquinas preparadas para caçar e se defender, ao contrário dos armamentos construídos pelo homem. O objetivo das serpentes é sobreviver e não atacar o homem. Do ponto de vista delas, o homem é um animal grande demais para comer, com pés e mãos ameaçadores e enormes, sempre invadindo seu "cantinho".

Se o homem conseguisse andar no mato ou trabalhar na lavoura sem ameaçar as serpentes, não haveria acidentes: as cobras jamais tomam a iniciativa de atacar, nem fazem emboscadas no caminho. O que realmente acontece, na maioria das vezes. é que o homem não vê a cobra e, sem perceber, interrompe sua fuga, ou ainda, enfia a mão num buraco onde a serpente se refugiou. E aí a cobra não tem outra defesa senão usar seu veneno.

A COBRA PODE SER UMA ALIADA:

O melhor mesmo é seguir a velha recomendação de usar botas de cano alto ou botinas com pederneiras de couro para prevenir acidentes e também não enfiar a mão em buracos.

Para prevenir acidentes, também é importante conhecer alguns hábitos das cobras e tentar evitar o contato direto com elas. Assim, de seres ameaçadores, elas podem se transformar em bons aliados do produtor rural, pois alimentam-se sobretudo de ratos.

As cobras são animais de sangue frio e dependem do ambiente para se aquecer. Mas não podem ficar sob o sol direto, para não ressecar. Por isso preferem os locais úmidos, escuros e quentes e se refugiam em montes de lenha, lixo, paióis , palhadas, cupinzeiros, folhagens etc. Gostam de tomar sol em trilhas no mato, em canaviais ou cafezais. As trilhas são mais quentes do que a sombra das árvores e, ao mesmo tempo, oferecem opções de fuga e abrigo, caso algum animal de grande porte as ameace.

ONDE TEM RATO TEM COBRA:

O alimento preferido da maioria das serpentes, sobretudo cascavéis e jararacas, são os ratos. Por isso, elas habitam os mesmos lugares que esses roedores. E como o homem abriga e alimenta uma grande quantidade de ratos, ao armazenar comida e produzir lixo, muitas espécies de cobras vivem próximas do homem.

Uma boa maneira de evitar acidentes, portanto, é a limpeza de terreiros, paióis, áreas próximas das casas, onde ratos e serpentes possam se abrigar. Nas colheitas de grãos e frutas e nas hortas, cuidado com as mãos: é melhor trabalhar com luvas. Tapar os buracos de portas, janelas c muros também é uma boa providência. Cuidado ao calçar botas, botinas e sapatos. Para as cobras e outros animais peçonhentos, os calçados são tocas excelentes abrigos.

 

As venenosas mais comuns

Nem todas as cobras são venenosas, existem características, através das quais é possível distinguir se uma cobra é ou não venenosa. Coloração, formato da cabeça, entre outras, podem ajudar na identificação do animal. Mas quem tem sangue frio a ponto de ficar estudando as características de uma serpente, quando encontra uma? O bom mesmo é seguir outro caminho. Conheça a seguir as cobras que ocorrem com mais freqüência em nossa região.

JARARACA
(grupo botrópico)

Há 32 espécies e subespécies do gênero Bothtops, das quais as mais conhecidas são a jararaca (B. jararaca), a cotiara (B. cotiara), a jararacuçu (B. jararacussu), a urutu (B. alternatus), a caiçaca (B. moojeni), a boca-de-sapo (B. neuwiedi) e a surucucu. Todas elas recebem a designação comum de jararaca. Ocorrem em todo o Brasil, em todo o tipo de terreno e vegetação, embora prefiram os lugares úmidos, e são responsáveis por quase 90% dos acidentes com cobras venenosas no País. O tratamento é feito com soro antibotrópico, específico contra o veneno de jararaca, antibotrópico-laquético, contra veneno de jararaca e de cascavel.

CASCAVEL
(grupo crotálico)

O gênero Crotalus compreende cinco espécies, caracterizadas por um chocalho na ponta da cauda e comumente chamadas de cascavel. São encontradas sobretudo em terrenos secos e pedregosos do Centro-Sul, Nordeste e de regiões altas da Amazônia.

As picadas de cascavel geralmente não provocam dor muito intensa.

O tratamento é feito com soro anticrotálico ou com soro antibotrópico-crotálico.

CORAL-VERDADEIRA
(grupo etapílico)

As 29 espécies conhecidas do gênero Micrurus são chamadas de corais-verdadeiras e é muito difícil diferencia-las das falsas corais, que são de família e gênero diferentes, menos agressivas e não venenosas. A coral-verdadeira é considerada a mais perigosa das serpentes, mas também a mais rara: embora ocorra em todo o Brasil, tem hábitos semi-subterrâneos e geralmente só aparecem quando há inundações ou quando se revolve a terra.

Além disso, não dá bote e tem a boca pequena, com presas menores que as das outras cobras venenosas. Só pica quando pisoteada ou tocada. É responsável por menos que 1% dos acidentes com cobras venenosas, quase sempre nas mãos ou nos pés.

Nos primeiros momentos, o local da picada, como no caso da cascavel, não fica muito dolorido, mas amortecido, com sensação de adormecimento e formigamento.

O tratamento é com soro antielapídico, específico contra o veneno das corais-verdadeiras.

 

Acidentes: Como agir?

Em caso de acidente com cobras, procure imediatamente o serviço de saúde mais próximo. Até a chegada ao posto de saúde, faça o seguinte:

1 Mantenha a vítima deitada, evite que se locomova. Os movimentos podem acelerar a absorção do veneno pelo organismo. É importante manter o membro ferido em posição mais elevada que a do resto do corpo.

2 Nunca faça garrote ou torniquete, que impedem a circulação do sangue e podem causar necrose e gangrena.

3 Não coloque nada no local da picada - muito menos folhas, fumo, pó de café, terra, fezes (embora pareça absurda, essa prática é comum no interior).

4 Não perfure o local da picada. Alguns venenos provocam hemorragias, que podem ser agravadas. Além disso, lâminas ou agulhas não desinfetadas podem causar infecção.

5 Se possível, traga o animal causador do acidente para que se possa identificá-lo com segurança e assim saber qual o soro específico para aquele caso. Se não der, tente observá-lo para, depois, fazer um "retrato-falado" no posto de saúde.

6 Não perca tempo com tratamentos improvisados. Somente o soro evita o agravamento dos sintomas da picada de cobra. E ele deve ser aplicado o quanto antes, na quantidade correta.

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